domingo, 29 de novembro de 2015

Resumo:"Das Independências às Liberdades", de Severino Ngoenha

Um breve resumo de "Das Independências às Liberdades", de Severino  Ngoenha 



Introito:

Das Independências às Liberdades é uma obra do filósofo moçambicano Severino Elias Ngoenha. Num contexto em que urge a necessidade de uma reflexão sobre os conceitos Liberdade e Independência no panorama do pensamento africano, Severino Ngoenha discute a liberdade como a base da historicidade dos africanos, assinalando-a, também, como característica humana por excelência. O autor pretende, ao mesmo tempo, debater a questão do futuro nas sociedades africanas, num contexto em que os próprios africanos são chamados a ser mestres dos seus destinos,responsáveis pela construção de um futuro diferente. O autor enaltece o papel da filosofia num contextoincipiente como o das nações africanas, marcado ainda pela dependência ideológica e, sobretudo, económica.

Palavras-chave: Filosofia, Etnofilosofia, futuro, africano e utopia

O pensamento de Severino Elias Ngoenha enquadra-se, sem dúvida, no contexto em que o autor está inserido. Como a tradição filosófica hegeliana manda, Ngoenha é “filho do seu tempo” e, por tal, procurara discutir e, sobretudo, problematizar a sua realidade (Moçambicana, africana no geral), partindo de um contexto histórico marcado por um passado de colonização dos africanos.

Ciente da sua missão enquanto filósofo, logo na introdução, Ngoenhapostula a ideia de que cada sociedade tem a missão de definir seus objetivos, ambicionando legar à humanidade asua contribuição histórica no universo da existência humana.

“ À nossa geração incumbe a árdua tarefa de participar na elaboração de um futuro diferente do presente, que nos é dado viver e observar. Desde a meio século que vivemos o escândalo da fome, da ignorância, da mortalidade infantil da má nutrição de um nível de vida que não para de degradar” (NGOENHA, 2014:05)          

No contexto do desenvolvimento científico, várias teorias, de certa forma etnocêntricas, são desenvolvidas para legitimar a subjugação do negro, reafirmando sua posição inferior em relação ao branco.    
Ao analisar o primeiro meio século das independências dos países africanos, que começam, na sua maioria, na década 60, Ngoenha confronta-se com o problema da condição pouco evoluída da atualidade 

É que, segundo Ngoenha (2014), os países africanos optaram por variados modelos para o desenvolvimento social e económico, entretanto, pouco funcionou e, na sua maioria, os níveis de vida das sociedades que neles habitam ainda são muito baixos.     

1.Reformulação dos Projetos Africanos; Otimismo no Futuro

Num outro desenvolvimento, Ngoenha interrogar-se sobra a causa dos“insucesso” dos projetos africanos, levantando a questão: serão estes 50 anos um tempo perdido?

Na esteira desta ideia, o autor propõem uma rápida e urgente reformulação da nossa direção (enquanto moçambicanos, africanos no geral). Estendendo seu pensamento para o futuro, o autor convida-nos a olhar para o amanhã, depositando nele um certo optimismo.  

Para Ngoenha (2014), esta não é a primeira vez que o futuro torna-se o centro de debate. Mas, certamente, a primeira vez que ele é suscetível de ser encarado de maneira filosófica.

“De qualquer maneira, nossa missão é o futuro. E para que ele melhor se realize cada um é chamado a dar o melhor de si, no lugar onde se encontra” (NGOENHA, 2014: 06)




2.Eleição como a Escolha de um Futuro
Ngoenha entende que a reflexão sobre o futuro é demasiadamente complexa e nos chama a analisar possibilidade, tendo em conta a ideia da escola como um elemento para a introdução um código de ético e de cidadania, no processo da edificação da moçambicanidade.

É impossível pensarmos no futuro sem pensarmos nos projetos políticos que, a bom fim, regem a nossa existência enquanto sociedade, constata o autor.

Ngoenha entende que o momento da democracia é um momento de se confiar ao povo o poder, em termos teóricos, de decidirem pelo tipo de projeto político que querem, destacando também que a democracia é por excelência um problema do filosófico.

Para ao autor, quando em outubro de 1994 realizam-se as primeiras eleições em Moçambique levantava-se um aspeto importante, a questão da escolha adequada de um projeto político que norteasse o país.

“Assim, devemos julgar os partidos políticos em função dos projetos de sociedade que eles apresentam” (NGOENHA, 2014: 07)   

Para o autor, não escolhemos os governantes pela beleza que têm, pela cor das bandeiras dos seus partidos, mas, em princípio, por de trás de cada partido há ideias e propostas de um tipo de sociedade na conjuntura que estamos a trilhar.

Ngoenha entendeque quando damos o nosso voto a um partido significa que nós nos identificamos ou pensamos que, entre os projetos políticos que se nos apresentam sob forma de partido, aquele que escolhemos é o mais adequado para levar a, bom fim, as vontades do povo.

Ao interrogar-se sobre o valor das eleições de 1994 e, consequentemente, também sobre o valor de todos outros processos eleitorais que viriam a ser acompanhados por grandes transformações constitucionais em Moçambique, Ngoenha conclui que a crença num futuro melhor constitui uma forma de encarar a dura realidade da existência.

Citando Ray Bradbury, Ngoenha (2014) indica que ser capaz de fantasiar o futuro significa, em outros termos, ser capaz de sobreviver. Segundo o autor, os nossos sonhos estimulam, antecipam e favorecem a afirmação e o progresso da sociedade e é preciso e necessário reinventar o futuro para salvaguardamos a ideia de o amanhã ser diferente do passado. 

“O Futuro é o conjunto de projetos, de possíveis, de esperanças, de liberdade, porque temos de escolher entre os diferentes possíveis ou criar outros”( NGOENHA, 2014:10)  
             
Para o autor, a única forma que existe para que se garanta uma evolução na nossa vida enquanto sociedade e para que sejamos autores do nossa história, donos do nosso destino, é continuarmos a debater a nossa história, evitando, portanto, que ela seja apenas uma continuidade de um passado indesejado.

3. A Utopia, uma outra Forma de Pensar o Futuro

Ngoenha entende que a outra maneira de pensarmos o futuro é a utopia, que a considera-acapacidade de antecipar conteúdos concretos que se realizarão no futuro mais ou menos longínquo. É, de certa forma, uma fé racional, numa realidade não existente mas potencial, que representa um bem para quem a sustenta.

“A utopia é, sem dúvida, uma força fecunda da história, se for orientada e potenciada por uma verdadeira consciência humana. Isto pode justificar uma visão do homo utopicuscomo profeta do futuro, edo utopismo como uma corrente de pensamento que usa a esperança de maneira atenta e libertadora”.(NGOENHA,2014: 165) 

Para Ngoenha, a cidade utópica,assim como observaram, Platão, T. More, por exemplo, só pode acolher a fantasia política de um único utopista, porque só ele antevê a verdadeira forma de Estado e só ele encontrou a solução.

Assim sendo, acidade utópica é, na perspectiva de Ngoenha, o sonho de um só homem e seus habitantes carecem de uma dimensão histórica. Neste ponto, se pode avançar, encontramos uma certa debilidade da utopia. A mesma torna a história uma história sem nomes.

Ngoenha observa que os líderes nacionalistas africanos que lutavam pelas independências foram homens que tiveram sonhos ilustres e, sobretudo, tiveram a coragem de lutar para transformar os próprios sonhos em realidade.
Entretanto, após alcançadas as independências e no delírio de alcançar os seus sonhos, transformaram muitas vezes os próprios povos em instrumentos de realização das suas utopias.

E como na cidade utópica não se admite um segundo sonho, todos aqueles que ousarem sonhar diferente, pôr em dúvida a utopia dos dirigentes, foram vítimas da “ortodoxia utópica” dos primeiros, as revoluções tornaram-se opressões e os libertadores em opressores.

   Não obstante, Ngoenha destaca nossa responsabilidade como responsáveis da nossa história, fazedores do factos, pelo que responsáveis pelos contornos da nossa vida enquanto seres sociais.

“ A filosofia torna possível a vida do homem, porque lhe permite imaginar, projetar o futuro e enfrentá-lo. O pensamento, a filosofia, torna possível o amanhã. Mas, ao mesmo tempo, interroga-se sobre o tipo de amanhã”( NGOENHA, 2014: 11)

            O autor observa que a filosofia africana, por excelência, teve sempre esta preocupação com o futuro, tanto que muitas, segundo ele, das literaturas filosóficas africanas têm como denominador comum essa questão.

Aliás, mesmo as perspetivas críticas sobre a etnofilosofia de Towa e de Hountondji parecem ver no futuro a solução para superação desse conceito que, de certa forma, é pejorativo.       


Referências Bibliográfica:
NGOENHA, Severino. Das Independência às Liberdades, [S/E]. Maputo:Paulinas,2014




sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Opinião/sociedade: O Fim do Amor Romântico

O Fim do Amor Romântico











A palavra amor é, provavelmente, uma das mais comuns no vocabulário das nossas sociedades. Em todo lado, sem nenhuma reflexão sistematizada, dizemos “eu amo X” e/ou “eu não amo Y”. Do dia para noite, tornou-se simples rotular as nossas relações afetivas, principalmente as conjugais, com base neste termo, um conceito que é, deveras, vazio e abstrato.

Vivemos o que Zygmunt Bauman chamou de era do amor líquido, um tipo de apego leviano e instável, um sentimento superficial e condenado à rápida dissolução. A ideia que até o século XX dominou, do casamento como a união sagrada, salvaguarda pelo Senhor, parece assistir o seu fracasso na atualidade e, em posição, instituímos como direito a liberdade de separação.

Na corrida desenfreada rumo ao liberalismo, desfizemo-nos de toda uma tradição, eliminando a obrigação que nos foi imposta pela sociedade de eternizar os matrimónios e elegendo o “amor” como condição basilar para manter um relacionamento. Com este argumento, fizemos de nojentos sapos belos príncipes e de nojentos príncipes belos sapos, na busca desmedida de uma ideia platónicade um tal amor.

Meus caros, esquecemo-nos, no entanto, de uma dura e cruel realidade. O amor romântico foi uma invenção histórica necessária, defendida pelas principais instituições sociais (Estado, Religião e Família), na conjuntura de um projeto falhado de construção de uma sociedade nova, com raízes afetivas mais seguras e relações humanas mais duradoiras.

Tal como a ideia de Deus, o amor não existe como elemento coletivo e concreto, pelo contrário, é uma criação subjetiva e abstrata, em que cada um deposita seu significado particular, resultante da globalização e da influência da cultura ocidental sobre o homem desesperadodos nossos dias.


Todas as juras de amor que fizemos, as cartas de amor que escrevemos e as provas de amor que mostramos nada são senão subterfúgios, na linguagem existencialista, uma tentativa miserável de dar sentido ao absurdo existencial a partir de um elemento exterior a si (o Outro), suavizando o peso de ser o responsável pela tua grande obra-prima, a tua vida.

É o fim do amor romântico e a culpa é nossa. Fomos nós que ingenuamente substituímos o interesse pragmático pela ignorante ideia de que uma relação não é movida por interesses. Uma relação deve sim ser movida por interesses. A nossa carência coletiva, associada a incapacidade de aceitar a realidade bruta e utilitarista do novo mundo, não nos deixou perceber que nós estamos num outro paradigma, um momento em que o homem é convidado a reinventar os modelos de vida, seus princípios e suas motivações, tendo em conta toda a conjuntura do mundo contemporâneo.

Hoje, as nossas relações afetivas estão condenadas ao fracasso porque, do alto do nosso idealismo, criámos protótipos e o outro só é “amado” quando se encaixa perfeitamente no modelo por nós idealizado.

Esta perspetiva, excêntrica e narcisista, é um cancro para as nossas relações afetivas e obriga-nos a reinventá-las, submetendo-nos a uma busca ridícula e infinita de relação em relação, na medida em que ninguém se adequa exatamente ao nosso protótipo, simplesmente porque é uma ideia nossa.

O mito grego de hermafrodita, apresentada no “O Banquete”,  de Platão, refere que um dia homem e mulher eram um só,  um ser bissexual, feliz e completo. Mas, por vontade dos deuses, o ser foi divido em dois, tornando-o um ser incompleto. Por este motivo, escreve-se na obra, o Homem sabe-se um ser incompleto e vive buscando encontrar a sua outra parte, um processo complexo, se pensarmos na imensidão do mundo.


Nota-se, com este mito, que os gregos tinham noção da importância da aceitação da outra pessoa como um elemento subjetivo e singular, sustentando, de certa forma, que a robustez de uma relação reside na aceitação da autonomia do Outro, uma premissa contrária ao conceito do amor romântico atual.

Como pensou EmanuelLevinas, é fácil “amar” quem, como puzzle, se encaixa perfeitamente no teu mundinho, o difícil é aceitar a manifestação do Outro, no seu mundo, com os seus defeitos.


Somos, portanto, convidados a destruir as grandes idealizações românticas. Somos chamados a reinventar o amor, a partir de elemento concreto, a vida possível, os amores possíveis. 

NB: Escrito à luz do novo acordo ortográfico.
Publicado em http://www.fasdapsicanalise.com.br/author/estevao-azarias-chavisso/ , a 14 de dezembro de 2015.

Opinião: AS MENTIRAS DO NOSSO TEMPO E O CAMINHO PARA O FUTURO

AS MENTIRAS DO NOSSO TEMPO E O CAMINHO PARA O FUTURO Créditos : AS por:Lino A. Guirrungo (Jan, 2019) Eu nasci pouco depois que...