O espírito romântico dos finais do século XVIII
por: Estêvão
Azarias Chavisso
1. Ideia Geral
É,
indubitavelmente, um dos períodos mais lendários da história, a sua evolução
esteve extremamente ligado ao contexto histórico e político que caracterizava a
Europa nos finais do século XVIII e início do século XIX. A filosofia, a pintura,
escrita, a e as diversas formas de arte caracterizavam-se por uma abordagem imaginativa
e subjectiva, carregadas de emoção e carácter visionário ou onírico.
No compito geral, o
Romantismo será tido como a fase da eclosão de um o movimento artístico e
intelectual europeu, marcado pela subjectividade imaginativa do ser humano. Se,
por um lado, os movimentos filosóficos, literários e artísticos do período clássico
(civilização greco-romano) e neoclássico (época das luzes) eram delicados,
claros e completos, o movimento romântica, por sua vez, caracteriza-se por um
esforçar exacerbada na expressão o estado mais profundo da alma e sentimentos
intensos ou místicos, evitando claridade e a definição.
O presente resumo
ambiciona, de forma clara e objectiva, debruçar-se sobre do movimento romântico
europeu, com especial enfoque para o Romantismo literário. Todavia, para uma
abordagem mais exaustiva, será necessário abordar, mesmo que em linhas prévias,
o contexto histórico e civilizacional do surgimento do próprio Romantismo.
No primeiro capítulo, buscar-se-á analisar a génese do Romantismo
no seu todo, ou seja, observar-se-á o romantismo não só como um movimento
literário, mas também intelectual e artístico etc. No mesmo capítulo, contextualizar-se-á
o romantismo, buscando perceber os seus antecedentes.
No capítulo subsequente, tratar-se-á do ponto fulcral do
resumo em causa, o romantismo literário. Na senda deste capítulo, abordar-se-á
a essência do espírito romântico para, posteriormente, trazer-se as
características deste movimento literário europeu. O último capítulo está reservado
ao romantismo literário português, onde trar-se-á, de forma resumida, as
divisões do movimento romântico literário português e as suas características.
2.Génese
do Romantismo
2.1 Contextualização
Numa Europa
ocidental, caracterizada pelo desenvolvimento das forças produtivas, sociais,
económicas, ideológicas e morais, desperta um movimento artístico, intelectual
e autónomo designado Romantismo. Este movimento, segundo Alberto Ferreira,
“surge numa situação revolucionária geral provocada simultaneamente pela
rebelião da burguesia contra a ordem monárquica-feudal, por um lado, por outro,
pela revolta contra os compromissos das revoluções burguesas que não alcançaram
os resultados implícitos nas suas premissas políticas e ideológicas”. (FERREIRA,
1979 p.10) Sendo assim, o Romantismo literário será antecedido por uma tumultuosa
fase de fermentação, o que vai originar uma série de autores que chamados de
pré-românticos. Estes são detentores de um substrato de um iluminismo[1] emancipador dos valores clássicos. Alguns autores, com
base nesta distinção entre os pré-românticos e os românticos, chegam a afirmar
que existe uma tradicional oposição entre os clássicos e românticos. Porém,
Alberto Ferreira acredita que “é difícil sustentar a tese acima, pois, em bom
sentido hermenêutico, nem Rousseau[2] e nem Forster[3], escritores de formação iluminista, são clássicos no
verdadeiro sentido da razão filosófica setecentos. (Ibid. P.12)
As profundas
transformações psicológicas e sociais incutidas pela revolução renovam
certamente os dados propostos pelo iluminismo, entretanto, uma parte dos
românticos nem os nega nem os dissolve. Alberto Ferreira observa que “a queda
da revolução e do império alterou o espírito iluminista. Às grandes esperanças
sucede uma época de desilusão e esperanças desiludidas”. (Ibid. p.12)
Com efeito, importa
realçar que há os que, sem abandonarem a suas posições iluministas, têm uma
nova maneira de sentir. Porém, segundo Ferreira, “esta atitude geral, que
promove sobretudo o domínio da sensibilidade afectiva e da moral não serve para
integrar a arte nem justificar a posição frontal ao clássico”. (Ibid.
p.11)
Admite-se que os
centros maternos do romantismo tenham sido especificadamente a Inglaterra, a
França, a Escócia e a Alemanha. Entretanto, são sobre tudo os alemães que
melhor caracterizaram e definiram genericamente o romantismo.
2.3 Definição do Romantismo
O escritor alemão
Ernst Hoffmann[4] definiu a essência do romantismo como a “infinita
saudade”. Na escolha dos temas, os artistas do movimento romântico mostraram
grande afinidade com a natureza — especialmente em seu aspecto selvagem e
misterioso — assuntos exóticos, melancólicos, melodramáticos e que produzem
medo ou paixão. Prova disto é obra que se segue de um dos mais célebres
pintores românticos da história, Eugène Delacroix[5]
Bridgeman Art Library, London/New York
A Liberdade guiando o
povo
A Liberdade guiando o
povo (1830, Louvre, Paris) é
uma das obras mais nitidamente românticas e célebres de Delacroix. A tela,
comprada pelo governo francês, mas considerada excessivamente incitadora, só
foi exposta em 1848.
Alberto Ferreira,
citando Baudeilare, define o romantismo como “uma maneira de sentir” (Ibid.
p.10). A subjectividade e o espiritualismo, aqui já referidos, revelam-se
características básicas deste movimento.
3. Romantismo Literário
Até finais do
século XVIII, os gostos literários na Alemanha e na França separaram-se
progressivamente das tendências clássicas e neoclássicas. Os autores românticos
encontram sua primeira fonte de inspiração na obra de grandes pensadores
europeus: o filósofo francês Jean-Jacques Rousseau e o escritor alemão Johann
Wolfangvon Goethe[6]. O romantismo literário surge como uma escrita literário
caracterizado por sua entrega à imaginação e à subjectividade. Com efeito, este
ideal literário vai emancipar a liberdade de pensamento, de expressão e da
idealização da natureza.
Para alguns autores
o romantismo nasceu em oposição ao classicismo, e representa a estética e os anseios da classe
burguesa em ascensão. Peso embora tenha sido definido com exactidão na
Alemanha, como bem afirmou-se, foi somente na França, após a revolução burguesa
de 1789 que o movimento se expandiu.
3.1 O Espírito Romântico
Foi Rousseau quem
estabeleceu o culto ao indivíduo e celebrou a liberdade do espírito humano ao
afirmar: “Sinto antes de pensar”. Goethe e outros alemães incidiram em aspectos
mais formais, ao exaltar o espírito romântico manifestado nas canções populares
alemãs, na arquitectura gótica e nas obras do inglês Shakespeare. Goethe,
inclusive, se propôs a imitar a liberdade estilística de Shakespeare em sua
obra Götzvon Berlichingen[7], um drama histórico que justifica a insurreição contra a
autoridade política, inaugurando o movimento literário conhecido como SturmundDrang[8]
Com a difusão do
movimento romântico aos demais países da Europa, certos temas e atitudes
tornaram-se o centro das preocupações dos escritores do século XIX. Grande
parte dos movimentos libertários e abolicionistas do final do século XVIII e
princípio do século XIX originaram-se em conceitos da filosofia romântica. O
desejo de libertar-se das convenções e da tirania, a valorização dos direitos e
da dignidade do ser humano, a política e os temas sociais foram “temas-chaves”
na poesia e na prosa românticas em todo o mundo ocidental.
3.3 Características do Romantismo Literário Europeia
As principais características
do romantismo foram: primeiro, sua preocupação com a natureza. Segundo, o
prazer que proporcionam os lugares virgens e a presumível inocência dos
habitantes do mundo rural. Para Alberto Ferreira, "uma das características do
movimento romântico é colocar-se numa situação negadora de valores burgueses
mesmo quando o artista romântico alinha pelas revoluções burguesas". (Ibid.
p.11)
4. Romantismo Literário Português
Da ruptura com o
neoclassicismo, o romantismo português enquadra-se no contexto evolutivo do
próprio romantismo europeu. Este, por sua vez, desenrola-se ao longo do século
XIX. Porém, é divido em três fases: pré-romântica, ultra-romântica e por fim a Terceira
Geração.
4.1 Fase pré-romântica
Considera-se o ano
de 1825 como o início efectivo do romantismo literário português com a
publicação, em Paris, do poema Camões. Em 1826, foi publicado D. Branca, ambos
da autoria de Almeida Garrett[9], Alexandre Herculano[10] e António Feliciano de Castilho[11].
Estes autores deram
vida a primeira geração de escritores românticos que tinham como traços
dominantes, além da religiosidade, um regresso ao passado medieval, um sentido
regenerador, sentimentos nacionalistas moralizantes.
Exemplos Ilustrativos
Um trecho do romantismo português na fase pré-romântica,
de Alexandre Herculano, Eurico, O Presbítero (1867):
“…Eurico era uma destas almas ricas de sublime
poesia a que o mundo deu o nome de imaginações desregradas, porque não é para o
mundo entenda-las. Desventurado, seu coração de fogo queimo-lhe o viço ao
despertar dos sonhos do amor que o tinham embalado. A ingratidão de
Hermengarda, que parecera ceder sem resistência a vontade de seu pai, e o
orgulho insultuoso do velho prócere deram em terra com ânimo, e que o aspecto
da morte não seria capaz de abater…”( http:WWW.Enciclopédia icrMosoft® Encarta®. © 1993-2001 Microsoft
Corporation.( Consultado a 10 de Outubro de 2013 pelas 18:33)
4.2 Fase Ultra-romântica
Os anos 40 do
século XIX são assinalados pelo ultra-romantismo ou segunda geração romântica.
O fantástico dos temas, o imaginário sombrio e o desencanto emocional atingem o
auge. Camilo Castelo Branco[12]
na ficção, Soares dos Passos e João de Lemos na poesia, são seus maiores
representantes. Com a Geração de 1870 - e a profunda revolução literária e
cultural iniciada, em 1865, com a polémica entre Antero de Quental e Castilho[13] -
mais do que a negação do romantismo, o necessário passa a ser o reencontrar da
totalidade romântica em uma perspectiva capaz de ultrapassar as fronteiras
portuguesas e interligar a filosofia com a estética.
A intenção era
redescobrir os modelos do romantismo europeu, de Shakespeare[14] a
Dickens,[15]
de Goethe a Heine, além de outros, como Victor Hugo[16]
ou Proudhon, articulando-os com as novas tendências do realismo-naturalista de
Zola e o positivismo de Comte[17].
- Exemplo Ilustrativo, obra: Sonetos de Antero de Quintal
segunda fase do romantismo português
NIRVANA
Para além do Universo luminoso,
Cheio de formas, de rumor, de lida,
De forças, de desejos e de vida,
Abre-se como um vácuo tenebroso.
A onda desse mar tumultuoso
Vem ali expirar, esmaecida...
Numa imobilidade indefinida
Termina ali o ser, inerte, ocioso...
E quando o pensamento, assim absorto,
Emerge a custo desse mundo morto
E torna a olhar as coisas naturais,
À bela luz da vida, ampla, infinita,
Só vê com tédio, em tudo quanto fita,
A ilusão e o vazio universais.
Fonte: http://faroldasletras.no.sapo.pt/sonetos_antero_de_quental.htm (consultado a 10 de Outubro de 2013 pelas
19:40)
4.4 Terceira Geração do Romantismo Português
Na terceira geração
do romantismo destacam-se nomes como os de Eça de Queirós[18],
Teófilo Braga, Oliveira Martins, Batalha Reis e Adolfo Coelho, entre outros.Com
Queirós, dar-se-á inicio a uma nova fase chamada realismo. Porém, importa apenas
saber que o realismo, como um movimento literário artístico característico da
terceira fase do romantismo, preocupa-se em mostrar o comportamento humano nas
circunstâncias que o cercam ou representar figuras e objectos tal como actuam
ou aparecem na vida quotidiana.
Bibliografia:
FERREIRA, Alberto, Perspectiva do Romantismo Português, Universidade
do Wisconsin – Madison, Litexa Portugal, 3ª ed. 1979
FRANÇA, José
Augusto, O romantismo em Portugal: estudo de factos socioculturais,
Volume 6, Lisbioa Livros Horizonte,1974
http://faroldasletras.no.sapo.pt/sonetos_antero_de_quental.htm
(consultado a 10 de Outubro de 2013 pelas 19:40)
http: //enciclopédia emcarte2001.pt.com
(consultado a 5 de Dezembro de 2013)
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[1]Termo
usado para descrever as tendências do pensamento e da literatura na Europa e em
toda a América durante o século XVIII, antecedendo a Revolução Francesa. Foram
empregados pelos próprios escritores do período, convencidos de que emergiam de
séculos de obscurantismo e ignorância para uma nova era, iluminada pela razão,
a ciência e o respeito à humanidade.
[2]Rousseau,
Jean-Jacques (1712-1778), filósofo francês, nascido em Genebra. Destacou-se
como teórico político e social, músico, botânico e importante escritor do
Século das Luzes. O espírito e as ideias de sua obra estão a meio caminho da
Iluminismo do século XVIII — com sua defesa apaixonada da razão e direitos
individuais.
[3]Forster,
Edward Morgan (1879-1970), romancista e ensaísta inglês. Entre seus romances
destacam-se Onde os anjos não se aventuram (1905), A viagem mais longa (1907),
Uma sala com vista (1908), A mansão (1910), O caminho para a Índia (1924) e
Maurice (1971).
[4]
Hoffmann, Ernst Theodor Amadeus (1776-1822), escritor e compositor alemão,
influenciou o romantismo da literatura alemã. São famosos os Contos de Hoffmann
(1880) e as Fantasias à maneira de Callot (dois volumes, 1814-1815). Além do
romance As drogas do diabo (1815-1816), compôs música religiosa, música para
peças teatrais e a ópera Undine (1816).
[5]Pintor
francês cuja obra constitui um dos expoentes do romantismo do século XIX. Sua
técnica de aplicação da cor, em grandes contrastes, com pequenos golpes de
pincel, criou um especial efeito de vibração, que teria grande influência nos
impressionistas.
[6](1749-1832)
Poeta, romancista, dramaturgo e cientista alemão. Sua poesia expressa uma nova
concepção das relações da humanidade com a natureza, a história e a sociedade;
seus dramas e seus romances reflectem um profundo conhecimento da
individualidade humana. Sua influência na literatura da época é difícil de
medir.
[7]Uma tragédia Götzvon Berlichingen de 1773 que inaugurou o importante movimento
literário conhecido como SturmundDrangprecursor do romantismo alemão.
[8]SturmundDrang
(em alemão “tormenta e impulso”), movimento literário alemão (c. 1765-1785) que
surgiu como reação ao excessivo valor atribuído pelo Iluminismo ao intelecto, à
razão e ao refinamento da civilização. Este movimento foi o prelúdio do
romantismo.
[9]1799-1854),
Poeta iniciador do movimento romântico em Portugal. Dramaturgo e estadista
português, Almeida Garret renovou a
poesia, o teatro e a ficção sobre bases autenticamente lusitanas.
[10](1810-1877),
Político, historiador, poeta e novelista português, liberal apaixonado ao longo
de toda a sua vida. Além de importantes trabalhos históricos, como um estudo
sobre a Inquisição (1854-1859) e de sua História de Portugal, escreveu romances
como O monge de Cister (1848).
[11]
Poeta português. Foi tradutor e pedagogo, criando o Método de Castilho para a
aprendizagem das primeiras letras. Traduziu Píndaro, Virgílio, Anacreonte,
Moliére, Shakespeare, Goethe e Cervantes.
[12](1825-1890),
Romancista português, nascido em Lisboa. Ficou órfão muito cedo e teve uma
juventude instável e boémia. Entrou para um seminário, mas passou lá poucos
meses e, cansado da vida religiosa, abandonou-o e dedicou-se a escrever. Em
1885, foi nomeado visconde de Correia Botelho em reconhecimento a sua obra
literária. Cinco anos mais tarde, cego e com problemas de saúde, suicidou-se.
[13](1842-1891),
Poeta português. Muitos dos primeiros poemas de Antero de Quental pertencem à
escola romântica, estilo que, mais tarde, abandonaria. Seus livros de poesia
são Raios de extinta luz (1892), Primaveras românticas (1872) e Odes modernas
(1865), obras com clara influência do socialismo utópico.
[14](1564-1616),
Poeta e autor teatral inglês, considerado um dos melhores dramaturgos da
literatura universal. Além de dramaturgo foi ator de teatro e suas primeiras
obras — dois poemas eróticos segundo a moda da época, Venus and Adonis (1593) e
Lucrece (1594), e seus sonetos — lhe valeram a reputação de brilhante poeta
renascentista.
[15](1812-1870),
Romancista inglês e um dos escritores mais conhecidos da literatura universal.
Em sua extensa obra, combinou com maestria narrativa, humor, sentimento trágico
e ironia com uma ácida crítica social e uma aguda descrição de pessoas e
lugares, tanto reais como imaginários.
.
[16]
Hugo, Victor Marie (1802-1885), poeta, novelista e dramaturgo francês cujas
volumosas obras deram grande impulso ao romantismo no seu país. Entre sua
extensa e influente obra, destacam-se seus dramas Cromwell (1827), cujo
prefácio acabou se transformando em manifesto do romantismo, e Hernani (1830).
Como poeta, estreou com Odes et poésies diverses (1822) e publicou também,
entre outras, Vozes interiores (1837), os poemas satíricos Os castigos (1853) e
As contemplações (1856), o poema épico A lenda dos séculos (1859-1883) e A arte
de ser avô (1877). Atingiu sua máxima popularidade com romances como Han
d'Islande (1823), Bug-Jargal (1824), Nossa Senhora de Paris (1831) e Calude
Gueux (1834).
[17]
(1798-1857), filósofo positivista francês e um dos pioneiros da sociologia. Foi
colaborador do conde de Saint-Simon. Afirmava que do estudo empírico do
processo histórico dependia uma lei que denominou dos três estágios, ou fases,
pelas quais deve passar cada ramo do saber.
[18](1845-1900),
escritor português, introdutor do realismo em seu país. Com linguagem perfeita,
seus livros observam a classe dominante de seu tempo de maneira irrepreensível
e com um humor que, muitas vezes, beira a irreverência
.
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