domingo, 11 de dezembro de 2016

Literatura: Água. Uma Novela Rural, Entre a Escassez e Excesso


Água. Uma Novela Rural, Entre a Escassez e Excesso


Autor: Alberto Dalela Massango



Com as suas personagens redondas, dotadas de comportamentos inusitados e capazes de escravizar a vista de quem as lê, João Paulo Borges Coelho, escritor moçambicano que cruzou nomes históricos em Moçambique do século XX, ao longo da I Guerra Mundial, volta a brindar-nos com um acontecimento real em forma de ficção.
Neste novo romance, intitulado Água. Uma Novela Rural, através de um narrador heterodiegético, o autor do Olho de Hertzog mostra-nos que numa terra sedenta por água, este precioso, pode constituir motivo de guerras, descontentamentos, cepticismo, bem como ateísmo.

Logo na primeira página da diegese, o narrador, instituído por Borges Coelho, chama atenção sobre a necessidade de nunca se depositar confiança nesse líquido (a água), na medida em que ele depende da natureza e, como já se sabe, a natureza depende de si mesma - o homem não exerce nenhuma influência sobre fenómenos naturais e se a exerce, tal influência é insignificante.

As complexas personagens desta narrativa, que levam sempre o leitor à uma reflexão profunda, ao ponto de se questionar “o que fará a personagem X no capítulo seguinte; como a personagem Z vai-se comportar perante àquela transformação”, criam, paulatinamente, de capítulo em capítulo, se não for de parágrafo em parágrafo, um debate entre o leitor e o discurso do narrador.

Tal como afirma Borges, através da sua entidade fictícia, sobre a necessidade de nunca se confiar na água pelo facto de ela dividir opiniões, observa-se o diálogo conflituoso entre o homem campesino e o urbano, ambos dotados de conhecimentos distintos. Neste caso, o primeiro, com a sua tradição oral, é dotado de conhecimentos mitológicos passados de geração em geração, ao passo que o urbano, com recurso à escrita e tecnologias de informação e comunicação, acredita na solução científica (computadores, gráficos de medição de temperatura e diversas máquinas). 

O conflito entre o campo e a cidade constitui um elemento primordial que se pode observar na Água. Uma Novela Rural, pois os discursos das personagens, bem como os do narrador principal demonstram, nitidamente, a divergência ideológica entre ambos espaços.

É incrível que na narrativa em causa, já quase no fim, a estiagem, que assolava os habitantes da aldeia campesina, é substituída por terríveis cheias, ou seja, a escassez da chuva, que dizimara milhares de cabeças de gado e transformara rios sedentos e terras inférteis, fora substituída por um excesso de chuvas que, em contra partida, engolira os casebres e miríade de pertences das populações, bem como ceifara vidas humanas.

João Paulo Borges Coelho, com este novo romance, quer significar que a escassez e o excesso não prestam, ou seja, nunca trouxeram vantagens – daí a necessidade de sempre se optar pelo meio-termo, nem pouco nem muito apenas o normal.

Tal como o diamante, centro das atenções, no Olho de Hertzog, que não chega a ser achado nem descoberto o seu paradeiro, acontece com a protagonista deste romance, Maara, que após a enxurrada o narrador não chega a revelar o seu paradeiro, - não esclarece se ela foi salva ou engolida pelas cheias - deixando essa tarefa para o leitor.

João Paulo Borges Coelho, na Água. Uma Novela Rural, traz-nos um fenómeno particular nos nomes das personagens (Maara, Laago, Heera, Waaser, Floor, Praado, entre outros). Tal fenómeno é, linguisticamente, denominado Alongamento Vocálico, frequente nas línguas bantu e na língua inglesa.
ADM//EAC              

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