Aqui
Se Faz e Não Se Paga
por:Lino A. Guirrungo
Sempre que amanhece olho a parede
apática do meu quarto e vejo escancarada a inscrição: “o tempo não recompensa
homens impacientes”. É uma daquelas frases de efeito baratas, muito fáceis de
encontrar em qualquer diário da esquina. Nessa altura do campeonato, já não me
apego a grandes filosofias.
Cumpro com a minha rotina desde que
engrenei no selvático mundo do pós-universidade: visitar horas a fio sites de
emprego e, quando não encontro as vagas desejadas (como acontece na maioria dos
dias), entretenho-me nas redes sociais. Ao contrário do que achava um certo
pensador, actualmente o tempo é o maior luxo que tenho.
Hoje o grande assunto nas redes
sociais são os novos carros importados para os deputados e o relatório que
investiga as dívidas do anterior governo. Críticas chovem de todo lado: abuso
de autoridade, alguém devia ser preso, a PGR devia fazer o seu trabalho sem
interferências políticas, os deputados são uns sem vergonha. As críticas não se
fazem calar.
É óbvio demais que a nossa
“democracia” ainda é muito frágil. A democracia acarreta transferência e
prestação de contas do lado dos governantes e um alto sentido de exigência por
parte dos cidadãos e da tão propalada “sociedade civil”.
Quando o escândalo das dívidas nasceu
há já um ano, lembro-me de ter dito a um colega de faculdade que se nossos
políticos fossem sérios iam de demitir. Sabia que isso não ia acontecer. Nossos
políticos não são os únicos cínicos no mundo, basta olhar os políticos do
Brasil ou do nosso vizinho Zimbabwe na actualidade. Com evidente entusiasmo,
ele replicou que nas próximas eleições isso não passaria impune ao nosso povo.
“O povo desta vez vai se vingar nas eleições”, afiançou ele. O seu optimismo
parecia transcrever a evidente indignação colectiva.
No entanto, a indignação não leva
necessariamente à
acção. Já dizia Montesquieu que “o povo age, sempre, ou demais ou de
menos; às vezes, com mil braços derruba tudo; às vezes, com cem mil pés ele não
vai senão como os insectos”.
Infelizmente a nossa democracia se
resume em eleições, cujo vencedor é sempre conhecido de antemão. As campanhas
eleitorais, sem muita profundidade de debate, não passam de um enorme
protocolar desperdício de tempo. É inaceitável que continuemos atrelados à
visão eleitoralista da democracia. Devemos melhorar o debate quotidiano dos
processos políticos e, acima de tudo, a acção e pressão colectiva.
A visão de que todos problemas serão
resolvidos apenas em eleições é um abraço cego à ingenuidade e inação. As
eleições colocam-nos com as velhas opções de sempre. A nossa democracia deve
evoluir para um activismo social constante.
É incrível o nosso esquecimento
rápido. Da última vez que ouvi um discurso similar de “vingança nas eleições”
foi durante as greves de transporte e preço do pão. O vencedor das eleições
assombradas pelas greves aclamou-se pela vitória “retumbante”. A vingança não
chegou de acontecer. A oposição culpou a manipulação eleitoral, que é
verdadeira mas não explica tudo.
Em abono da verdade, aqui se faz e
não se paga. A impunidade e o abuso de poder é uma moda das nossas estruturas
de poder. O caso das dívidas é mais um episódio ultrajante entre muitos que já
tivemos. A contração das insustentáveis dívidas parece resultado de um
amadorismo na gestão pública. É de um contra senso galopante que o nosso país
tenha se endividado em nome de empresas cuja viabilidade é duvidosa, sem contar
a falta de experiência e capacidade de gestão das pessoas em frente das mesmas.
Não serão apenas as eleições nem as
nossas frágeis instituições de justiça a resolver tudo. A crítica constante nunca devem cessar. A
ideia é melhorar a responsabilização dos gestores públicos e não a tomada do
poder, como erroneamente alguns confundem.
Ainda temos um longo caminho por trilhar no caminho de uma efetiva
democracia.
Julho,
2017
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