segunda-feira, 17 de julho de 2017

Opinão:Aqui Se Faz e Não Se Paga

Aqui Se Faz e Não Se Paga                       


       por:Lino A. Guirrungo
Sempre que amanhece olho a parede apática do meu quarto e vejo escancarada a inscrição: “o tempo não recompensa homens impacientes”. É uma daquelas frases de efeito baratas, muito fáceis de encontrar em qualquer diário da esquina. Nessa altura do campeonato, já não me apego a grandes filosofias.
Cumpro com a minha rotina desde que engrenei no selvático mundo do pós-universidade: visitar horas a fio sites de emprego e, quando não encontro as vagas desejadas (como acontece na maioria dos dias), entretenho-me nas redes sociais. Ao contrário do que achava um certo pensador, actualmente o tempo é o maior luxo que tenho.
Hoje o grande assunto nas redes sociais são os novos carros importados para os deputados e o relatório que investiga as dívidas do anterior governo. Críticas chovem de todo lado: abuso de autoridade, alguém devia ser preso, a PGR devia fazer o seu trabalho sem interferências políticas, os deputados são uns sem vergonha. As críticas não se fazem calar.
É óbvio demais que a nossa “democracia” ainda é muito frágil. A democracia acarreta transferência e prestação de contas do lado dos governantes e um alto sentido de exigência por parte dos cidadãos e da tão propalada “sociedade civil”.
Quando o escândalo das dívidas nasceu há já um ano, lembro-me de ter dito a um colega de faculdade que se nossos políticos fossem sérios iam de demitir. Sabia que isso não ia acontecer. Nossos políticos não são os únicos cínicos no mundo, basta olhar os políticos do Brasil ou do nosso vizinho Zimbabwe na actualidade. Com evidente entusiasmo, ele replicou que nas próximas eleições isso não passaria impune ao nosso povo. “O povo desta vez vai se vingar nas eleições”, afiançou ele. O seu optimismo parecia transcrever a evidente indignação colectiva. 
No entanto, a indignação não leva necessariamente à acção. Já dizia Montesquieu que “o povo age, sempre, ou demais ou de menos; às vezes, com mil braços derruba tudo; às vezes, com cem mil pés ele não vai senão como os insectos”.
Infelizmente a nossa democracia se resume em eleições, cujo vencedor é sempre conhecido de antemão. As campanhas eleitorais, sem muita profundidade de debate, não passam de um enorme protocolar desperdício de tempo. É inaceitável que continuemos atrelados à visão eleitoralista da democracia. Devemos melhorar o debate quotidiano dos processos políticos e, acima de tudo, a acção e pressão colectiva.
A visão de que todos problemas serão resolvidos apenas em eleições é um abraço cego à ingenuidade e inação. As eleições colocam-nos com as velhas opções de sempre. A nossa democracia deve evoluir para um activismo social constante.
É incrível o nosso esquecimento rápido. Da última vez que ouvi um discurso similar de “vingança nas eleições” foi durante as greves de transporte e preço do pão. O vencedor das eleições assombradas pelas greves aclamou-se pela vitória “retumbante”. A vingança não chegou de acontecer. A oposição culpou a manipulação eleitoral, que é verdadeira mas não explica tudo.
Em abono da verdade, aqui se faz e não se paga. A impunidade e o abuso de poder é uma moda das nossas estruturas de poder. O caso das dívidas é mais um episódio ultrajante entre muitos que já tivemos. A contração das insustentáveis dívidas parece resultado de um amadorismo na gestão pública. É de um contra senso galopante que o nosso país tenha se endividado em nome de empresas cuja viabilidade é duvidosa, sem contar a falta de experiência e capacidade de gestão das pessoas em frente das mesmas.
Não serão apenas as eleições nem as nossas frágeis instituições de justiça a resolver tudo.  A crítica constante nunca devem cessar. A ideia é melhorar a responsabilização dos gestores públicos e não a tomada do poder, como erroneamente alguns confundem.  Ainda temos um longo caminho por trilhar no caminho de uma efetiva democracia.


Julho, 2017

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