quarta-feira, 1 de agosto de 2018

A Tomada do Frelimigrado


A Tomada do Frelimigrado

            CHOQUE! Essa é palavra que corre o mundo nesta manhã para descrever o que aconteceu ontem em Moçambique. E não poderia ser outra. Foi com choque que li as notícias. Dediquei-me a dois artigos de dois jornais nacionais. “Revolução ou Golpe de Estado? A tomada do Frelimigrado” questionava-se um deles na capa, enquanto o outro, num longo artigo de opinião, proclamava “O Povo no Poder: Caiu o reino do batuque e da maçaroca”.

Em pouco menos de 24 horas, o país mudou de regime, tem novo um Presidente Interino, metade dos governantes estão presos e a quase toda outra metade fugiu para o estrangeiro. Ninguém sabia ao certo explicar como tudo aconteceu tão rapidamente, mas havia certeza de como tudo havia começado. A mensagem estopim foi espalhada por telemóveis.

Juraria ainda ontem que ia ser mais uma dessas promessas de marchas e protestos que nunca chegavam de acontecer. Agora não consigo parar de rir com ironia ao lembrar de um trecho de uma dessas músicas do rapper Azagaia “se fosse o 25 de Junho, nem ias à Machava”. O novo 25 de Junho havia acontecido e eu não participei do processo.

Tudo começou no início da noite quando foram descobertos 7 carros contendo boletins de voto. Ninguém sabe ao certo a que partido político os boletins favoreciam. No entanto, quando os primeiros resultados eleitorais foram anunciados indicando uma onda vermelha em mais um ano eleitoral, parece que as pessoas perderam sono e não quiseram dormir. 

As mensagens começaram a ser partilhadas nessa altura. Dizia a mensagem do texto: “Povo no poder! Mandemos todos eles correr. Que venha connosco o corajoso que puder. Do Norte. Do Centro. Do Sul. De Todo Moçambique para todas praças e gabinetes.” De repente. A mensagem já estava no Whatsapp, Twitter e Facebook.

Enquanto eu me distraía na TV vendo diversão escapista Hollywodiana ignorando as mensagens de texto, o estopim havia sido ateado. As pessoas inundaram praças, entraram nas assembleias provinciais, invadiram esquadras e quartéis e, para a surpresa geral, os soldados e polícias reagiram como se fossem os mesmos da Rússia em 1917. Não houve gás lacrimogénio, alguns membros da FIR protestantes foram neutralizados.

À meia-noite parece que metade do governo havia fugido para o estrangeiro. Foi aí que último bastião foi tomado: a capital. Tal como na luta de libertação, a capital era o destino final da revolta. Marchantes de Manhiça, Marracuene, Matola, Magoanine, Maxaquene e até Sommerschield saíram de casa e foram a marcha. E tomaram tudo.

Nossos políticos na valem nada e porque não sabem se comemos antes de dormir, não devem falar por nós. Ontem todo moçambicano subitamente reconhecia isso e fizeram uma revolução. Aliás, todos menos eu, pois a meia-noite eu já dormia.
 Lino A. Guirrungo
(Julho, 2018)

Um comentário:

  1. Muito boa comunicação literária em narração do rumo político que caracteriza os dias que correm nao só em Moçambique mas também um pouco em todo canto do mundo. O texto relembra que as revoluções só adormeceram por uns tempos mas não desapareceram!

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